Artigos Postado no dia: 3 outubro, 2024

Os novos parâmetros definidos pelo STF para concessão de medicações na Saúde Pública

Fernanda Piva Gomes

 

O Supremo Tribunal Federal, em recente julgamento datado de 26/09/2024, fixou as teses aplicáveis ao Tema 6 de Repercussão Geral, que deu origem à Súmula Vinculante nº 61, definindo que “A concessão judicial de medicamento registrado na ANVISA, mas não incorporado às listas de dispensação do Sistema Único de Saúde, deve observar as teses firmadas no julgamento do Tema 6 da Repercussão Geral (RE 566.471)”.

De acordo com as referidas teses, a concessão de medicamentos registrados na ANVISA mas que não constam nas listas do SUS (Rename, Resme e Remune), somente poderão ser concedidas na via judicial, independentemente de seu custo, quando comprovado, pelo autor, o atendimento cumulativo de todos os requisitos definidos no Tema, a saber:

  1. a) negativa de fornecimento do medicamento na via administrativa, nos termos do item ‘4’ do Tema 1234 da repercussão geral;
  2. b) ilegalidade do ato de não incorporação do medicamento pela Conitec, ausência de pedido de incorporação ou da mora na sua apreciação, tendo em vista os prazos e critérios previstos nos artigos 19-Q e 19-R da Lei nº 8.080/1990 e no Decreto nº 7.646/2011;
  3. c) impossibilidade de substituição por outro medicamento constante das listas do SUS e dos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas;
  4. d) comprovação, à luz da medicina baseada em evidências, da eficácia, acurácia, efetividade e segurança do fármaco, necessariamente respaldadas por evidências científicas de alto nível, ou seja, unicamente ensaios clínicos randomizados e revisão sistemática ou meta-análise;
  5. e) imprescindibilidade clínica do tratamento, comprovada mediante laudo médico fundamentado, descrevendo inclusive qual o tratamento já realizado; e
  6. f) incapacidade financeira de arcar com o custeio do medicamento.

Ainda de acordo com o julgado, caberá os julgadores, ao apreciar pedido de concessão de medicamentos não incorporados, a observação obrigatória da a) análise do ato administrativo comissivo ou omissivo de não incorporação pela Conitec ou da negativa de fornecimento da via administrativa, à luz das circunstâncias do caso concreto e da legislação de regência, especialmente a política pública do SUS, não sendo possível a incursão no mérito do ato administrativo; b) aferição da presença dos requisitos de dispensação do medicamento, previstos no item 2, a partir da prévia consulta ao Núcleo de Apoio Técnico do Poder Judiciário (NATJUS), sempre que disponível na respectiva jurisdição, ou a entes ou pessoas com expertise técnica na área, não podendo fundamentar a sua decisão unicamente em prescrição, relatório ou laudo médico juntado aos autos pelo autor da ação; e c) no caso de deferimento judicial do fármaco, oficiar aos órgãos competentes para avaliarem a possibilidade de sua incorporação no âmbito do SUS; sob pena de nulidade da decisão judicial, nos termos do artigo 489, § 1º, incisos V e VI, e artigo 927, inciso III, § 1º, ambos do Código de Processo Civil.

Da leitura da tese construída no voto, verifica-se que a mesma é baseada em 3 principais premissas, quais sejam: limitação de recursos e a busca por eficiência nas políticas públicas; a igualdade de acesso à saúde e o respeito à expertise técnica e à medicina baseada em evidências, diante do reconhecimento, pela Corte, de que os recursos públicos são finitos e que a judicialização excessiva pode comprometer a sustentabilidade do sistema de saúde.

Vale destacar que o julgado define as diretrizes tanto ao proponente da ação quanto aos julgadores da matéria, reforçando a importância do embasamento e comprovação técnica dos pedidos, afastando por completo o casuísmo e a famosa “ditadora da prescrição médica”.

Fazendo-se um comparativo com saúde suplementar e com as premissas que norteiam a concessão de tratamentos sem previsão no Rol da ANS, que é o balizador de cobertura da saúde privada, é possível concluir que, em ambas as esferas, as Cortes vêm reconhecendo, paulatinamente, que a cobertura ilimitada de tratamentos de saúde sem a observação conjunta de premissas técnicas respaldadas na medicina baseada em evidências, bem como orçamentárias, acabariam por colapsar os sistemas público e privado de saúde no País.

 


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