
Por trás do título deste artigo, há um contexto. Uma empresa em dificuldades financeiras, entendendo ser capaz de superar o período de crise, ajuíza uma Ação de Recuperação Judicial. O Juiz autoriza o processamento da Recuperação, os credores são todos listados e a empresa apresenta o seu Plano de pagamento do débito. No Plano, a empresa propõe um abatimento percentual da dívida, sugere um parcelamento e indica um período de carência para se reorganizar. Os credores, de um lado, pensam que é um absurdo concederem tal desconto, tal carência e ainda receberem o crédito em tantas parcelas. De outro lado, pensam que, se não aprovarem o Plano, a tendência é a decretação da falência, caso em que a probabilidade de recebimento do crédito diminui. Afinal, se a empresa está ativa, ela gera faturamento e gera lucro, com o qual pagará os credores. Se falir, apenas reúne-se o eventual ativo para ser liquidado, com forte tendência de tão só os credores preferenciais receberem algum valor. Bom, superado o dilema, ocorre a vocação em Assembleia e o Plano é aprovado. Os credores têm a sensação que, mesmo com a redução e o parcelamento, a situação está resolvida. Então, retoma-se o título: e se a empresa descumprir o Plano da RJ?
Cuidado, credores! É preciso cuidado ao aprovar o Plano. Isso será determinante para a hipótese de descumprimento.
Nos Planos de RJ, além da estratégia econômico-financeira da recuperanda, identificam-se estratégias por vocês não tão claras a olhos nus. O primeiro alerta diz respeito ao prazo para início dos pagamentos. Comumente, os Planos preveem que o marco inicial para início do período de carência, findo o qual iniciará o prazo para pagamento, é o trânsito em julgado da decisão que homologar a decisão da Assembleia que aprova o Plano. Ou seja, não é a data da Assembleia, nem a data da decisão que homologar a aprovação. É o trânsito em julgado de tal decisão. Isso significa que, entre a data da Assembleia e o tal marco inicial, podem passar anos. Ora, tomada a decisão pelos credores em Assembleia, ainda será preciso haver manifestação do Administrador Judicial e manifestação do Ministério Público para, após, o processo ser remetido ao Juiz para homologação. Em meio a isso, normalmente há questões incidentais a serem resolvidas, que tomam muito tempo. Ao final, homologado o Plano, poderá haver recursos e mais recursos, para só então ocorrer o trânsito em julgado. Desta forma, é fundamental que os credores estejam atentos para evitar que os marcos temporais de início dos pagamentos não estejam adstritos ao trânsito em julgado da decisão que homologar o Plano, mas sim à data em que publicada a decisão que o homologar.
O segundo alerta importante diz respeito ao prazo de carência que costuma ser proposto por empresas em Recuperação e que, na lógica econômica de reorganização do fluxo de caixa, realmente pode fazer sentido. Por vezes, a recuperanda propõe o aumento do prazo de carência, acenando com a redução do prazo do parcelamento, gerando resultado que, na soma dos períodos, indica o recebimento em menor prazo. Isso é atrativo. Contudo, não se pode deixar de observar que, segundo a Lei de Recuperação Judicial, o processo fica sob a fiscalização judicial pelo prazo de 2 anos, de forma que, se a empresa cumpre o Plano da RJ durante os 2 primeiros anos, isso gera a extinção da RJ. Logo, caso o Plano preveja 2 anos de carência, isso praticamente significa que o biênio de fiscalização terminará em simultâneo com o vencimento da primeira parcela. Se a carência for de 1 ano e meio, bastará o cumprimento de 6 meses das parcelas, e a RJ será extinta; ou ainda, mesmo no cenário de carência de 1 ano e meio, basta que a periodicidade de pagamentos seja anual, e a primeira parcelará vencerá após o biênio. Evidentemente não significa que a recuperanda esteja desobrigada de cumprir as obrigações vincendas após esses 2 primeiros anos (biênio de fiscalização), mas significa que, no âmbito da RJ, é isso o que será exigido. Após, “se a empresa descumprir o Plano”, caberá a cada credor buscar seus direitos, ajuizando ação autônoma e independente.
Portanto, cuidado, credores.